Valor dos clássicos
Combinando características de antiguidade, símbolo de status, objecto útil e, nalguns casos, obra de arte, os Clássicos têm regras de valorização muito próprias.
Existem características gerais, aplicadas a modelos em abstracto, que estabelecem uma certa hierarquia de valores. Um automóvel desportivo de uma marca conhecida e respeitada, por exemplo, um Jaguar E, vale mais do que um modelo utilitário de uma marca popular, como um Fiat 600. Não estamos a falar deste ou daquele Jaguar E ou deste ou daquele Fiat 600. Referimo-nos em abstrato, a todos os Jaguar E e a todos os Fiat 600, atentando a uma série de características gerais.
A primeira das quais é a raridade. O número de bens existentes condiciona a oferta disponível. Se a procura for superior à oferta, o valor sobe. Simples e verdadeiro para todos os bens, seja um quadro de Van Gogh, um Volkswagen ou um quilo de batatas. No caso de um automóvel, a raridade pode referir-se à totalidade de exemplares produzidos ou à quantidade existente num dado mercado.
Outra condicionante do valor de um automóvel é a qualidade. Se um automóvel tinha qualidade superior na sua época, com o passar dos anos, esse será um factor de valorização em relação aos modelos fabricados na mesma época. A qualidade refere-se não apenas ao seu fabrico, mas abrange também a concepção mecânica, o design e uma importante componente de inovação tecnológica. Todos estes factores contribuindo para que, na sua utilização, esse modelo se destacasse dos demais.
Outro factor essencial para o valor de um automóvel é o seu carisma, que se manifesta através de duas vertentes: um capital de simpatia conferido pelo público em geral e uma imagem de “status” associada ao modelo em questão. Este factor pode mesmo pesar mais do que a raridade e qualidade. Um caso particular que reflecte esta realidade traduz-se na relação de valor entre o Fiat 600 e o Fiat 500. O primeiro é um automóvel muito superior em termos de qualidade, mas o modelo mais pequeno, com uma imagem mais simpática, tem um valor bastante superior.
Bastante decisivo para a determinação do valor de um automóvel clássico é o imposto a aplicar no caso da sua importação. O valor dos automóveis importados condiciona o valor dos automóveis existentes, na medida em que existe uma facilidade cada vez maior em mandar vir o automóvel pretendido do estrangeiro. O valor do automóvel importado é obtido somando ao preço de aquisição o custo de transporte e legalização no nosso país. Se determinado modelo não está isento de pagamento de imposto no país de destino, (o que, em Portugal, só acontece com automóveis fabricados há mais de 30 anos), o seu valor final poderá ser bastante superior ao valor de aquisição.
Quanto às características particulares a considerar – tomando cada exemplar em concreto – existem alguns factores de valorização muito importantes:
O primeiro deles é a história ou proveniência do automóvel. Qualquer objecto cuja existência de prolonga por vários anos, adquire uma história. A relevância e conhecimento desses factos podem ser uma mais-valia para esse objecto, sobretudo se lhe conferirem um valor histórico relevante. É o caso da existência de documentação que comprove todo ou parte do seu percurso: facturas de aquisição, manutenção, certificados emitidos por entidades competentes, fotografias. Toda a documentação disponível enriquece o automóvel, porque contribui para certificar a sua autenticidade. Quanto mais importante seja a sua história, mais importante para a sua valorização será comprová-la. Quando estamos a lidar com automóveis de competição, com palmarés significativo, ou que tenham pertencido a personalidades de renome, ou tenham estado envolvidos em acontecimentos especiais (um filme ou um assalto famoso a um banco, por exemplo), a possibilidade de comprovar que era esse mesmo automóvel e não outro pode fazer uma diferença de vários milhares de euros.
O estado ou condição do automóvel é um factor primordial para o seu valor. O restauro de um Clássico é uma actividade demorada e dispendiosa, impedindo o desfrute imediato do automóvel, reservando inúmeras surpresas – normalmente, desagradáveis – para aqueles que abracem o desafio de forma entusiasta e irracional.
Dentro das diversas condições em que podemos encontrar um clássico, o muito bom estado original é o mais valorizado, porque, para além da boa conservação do automóvel, confere-lhe também uma grande autenticidade. É também uma situação bastante rara.
O restauro dito de concurso, produto de uma recuperação completa, em que o resultado final é superior àquele em que o automóvel saiu de fábrica, é também um dos mais valorizados.
Dessas condições de extremos ao projecto de restauro – automóvel completo, mas a necessitar de uma recuperação total – existem diversos estados intermédios.
Naturalmente, um automóvel que esteja apenas em condições de servir para peças, sem possibilidade de recuperação, vê o seu valor muito reduzido.
Finalmente, o ano de fabrico pode condicionar o valor de um automóvel se, por exemplo, condicionar a sua entrada num determinado evento. Por exemplo, um Lancia Aurelia B20 de 1957 pode ser aceite na prova retrospectiva das Mille Miglia, mas um modelo idêntico produzido em 1958, não.
Texto de Adelino Dinis, originalmente publicado no Guia Vintage de Veículos Clássicos de 2006 e 2007